21 março 2018

Sebastião da Gama: "Louvor da Poesia", por José Nobre


Cascata da ribeira do Alcube, na Serra da Arrábida


Poucos terão sido os poetas, mormente os eruditos, que não versejaram a respeito da poesia ou, dito por outras palavras, que não fizeram da poesia (ou da arte poética, se se preferir) o objecto do poema. Entre eles, e com vários espécimes publicados, conta-se o poeta que chamava à Serra da Arrábida a sua Serra-Mãe: Sebastião da Gama. A nossa escolha, para este Dia Mundial da Poesia, recaiu naquele que dá pelo título de "Louvor da Poesia". É recitado pelo actor José Nobre, sobre lastro musical concebido e executado pelo (já desaparecido) pianista e compositor Rui Serôdio, e foi extraído do CD "Sebastião da Gama: Meu Caminho É por Mim Fora" [vide capa ao fundo], produzido pela Associação Cultural Sebastião da Gama e publicado em 2010, com chancela JGC.
António Cardoso Pinto, saudoso realizador de rádio, recitador e poeta [biografia e poemas no site Triplo V], manteve na Antena 1, durante sete anos (de 1996 a 2003) um memorável apontamento de poesia, primeiramente chamado "À Esquina da 1", depois "À Esquina do Século", e finalmente "À Esquina do Mundo". Esta última denominação prendia-se com o facto da fonte dos poemas ser a volumosa antologia "Rosa do Mundo: 2001 Poemas para o Futuro" (Assírio & Alvim, 2001), organizada por Manuela Correia, sob a direcção editorial de Manuel Hermínio Monteiro. Nunca mais existiu no canal uma rubrica regular de poesia. Perguntamos: e porquê, se há tanto e bom material no arquivo, sem esquecer o disponível em discos? Uma coisa nada dispendiosa de se fazer e com a vantagem de dar à Antena 1 um toque de distinção no panorama das rádios de 'playlist'. Ou será que a direcção de programas entende que os ouvintes de hoje já não são merecedores desse "luxo cultural" que é a poesia?



LOUVOR DA POESIA



Poema de Sebastião da Gama (in "Campo Aberto", Lisboa: Portugália, 1951; Lisboa: Edições Ática, Colecção Poesia, 4.ª edição, 1983 – p. 45)
Recitado por José Nobre* (in CD "Sebastião da Gama: Meu Caminho É por Mim Fora", JGC, 2010)
Música: Rui Serôdio


Dá-se aos que têm sede,
não exige pureza.
Ah!, se fôssemos puros,
p'ra melhor merecê-la...

Sabe a terra, a montanhas,
caules tenros, raízes,
e no entanto desce
da floresta dos mitos.

Água tão generosa
como a que a gente bebe,
fuja dela Narciso
e quem não tenha sede.


* José Nobre – voz
Rui Serôdio – piano
Selecção de textos – João Reis Ribeiro e Maria Barroso
Produção – Associação Cultural Sebastião da Gama
Gravado no estúdio Sounds of Heaven, Lisboa, em Outubro de 2009
Gravação de vozes – David Neutel
Mistura e masterização – Jorge Calheiros



Capa do CD "Sebastião da Gama: Meu Caminho É por Mim Fora" (JGC, 2010)
Grafismo por Jorge Calheiros
O disco contém 26 poemas recitados por Fernando Guerreiro, Célia David, Maria Clementina, Maria Barroso e José Nobre.

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Outro artigo com poesia de Sebastião da Gama:
Sebastião da Gama: "Poesia", por Carmen Dolores

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